segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

A GENTE VIVIA NUM PALÁCIO

A gente vivia num palácio. De prata, pernas, música dos séculos passados, rendas, de vermelho e champagne e de luxúria. Ah, sim, luxúria poderia ser o nome do nosso reino. Era quase um reino. Tínhamos nossos próprios seguidores e leis, mandávamos em tudo. Éramos mimados e fogosos como adolescentes nobres de Antiga Borgonha. Eu, por exemplo, achava que não se podia ser mais feliz. Só que Laura era ingrata. Não lhe bastava ser a mais desejada, a mais esperada, a mais rica, a melhor dançarina... Não! Ela não gostava de nada. Era a única puta que nunca foi minha, a única que nunca piscava para mim, a única que nunca aceitou presentes meus ou me visitou no quarto ou sequer chamou meu nome em voz alta. Todavia, eu sabia que ela me amava porque eu a amava também. Então, partiu. Partiu de sua própria vontade e não disse nada a ninguém porque nunca lhe convinha falar nada pra ninguém em hora alguma.

Virginia, por sua vez, sempre soube de tudo. Não que Laura tivesse lhe falado algo, mas porque conhecia sua amiga e esperava tal reação. Tanto foi que a própria Virginia, chorosa há vários meses, me comunicou que Laura voltaria ao palácio. Disse-me que soubera através da negra do rio que tudo via e eu não pude descrer ou ficar mais feliz.

Foi quando resolvi trocar todas as lâmpadas da casa, lavá-la com calêndula que era seu cheiro favorito, até arrumei sua cama e comprei-lhe um novo par de meias e tudo mais. Ansiava por Laura e seu sorriso radiante, junto a sua mania de acertar os laços no cabelo e sua inseparável cigarrilha cor-de-argila. Tão inseparável que fumava até quando dançava e quando dançava era quase nirvana.

Ah, mas Laura, quando voltou, ainda era ingrata e chegou de cara feia, sem cigarros, sem laços no cabelo, como se tivesse vergonha de ter voltado. Mas que decepção, nós que nos amávamos tanto... Nós que a amávamos tanto! Nós! Nós que éramos sua família e sentimos sua falta. Pois Laura não olhou para ninguém, nem mesmo foi ter com o varão. O olhar de Laura era o olhar de quem queria fugir mais uma vez.

Mas lembre-se, não fui quem te contou tudo isso, não foi sequer outro homem.

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